Verdade que, em dezembro, já eram obviamente inequívocos os sinais de isolamento do governo, em meio a uma deplorável situação econômica e a baixíssimos índices de popularidade presidencial.
O pedido de impeachment, contudo, fundamentava-se sobretudo nas irregularidades cometidas pela presidente na gestão do orçamento público, as chamadas pedaladas fiscais -tema que parece hoje chamar menos a atenção da expressiva maioria de brasileiros que defende o afastamento de Dilma.
Agora, o conjunto da obra, por assim dizer, oferece gama de motivos muito maior, e bem mais palpável, para a indignação popular.
Da nomeação do ex-presidente Lula para o Ministério da Casa Civil, não sem razão vista como subterfúgio para evitar que ele caísse nas malhas da primeira instância judicial, até os recentes episódios da delação premiada do ex-líder do governo no Senado, Delcídio do Amaral (MS) o que se vê é a derrocada moral e política de todo o sistema petista.
Consequência disso, à inédita manifestação de domingo passado (13) se seguiu notável estado de mobilização permanente contra o governo Dilma. Além disso cresceu, nos últimos dias, o apoio ao impeachment da presidente, passando de 60%, em fevereiro, para 68% agora, segundo o Datafolha.
Rejeitado por 69% da população, o governo até que demonstrou capacidade de reação surpreendente na sexta-feira (18). Atos em todos os Estados do país procuravam se contrapor aos protestos anti-Dilma. Em São Paulo, único ponto em que o Datafolha fez medição, reuniram-se 95 mil pessoas.
Foi, por um lado, a maior manifestação pró-Dilma, quase dobrando o contingente (55 mil) registrado no recorde anterior, em dezembro. Por outro, contudo, somados os públicos de domingo (500 mil, contra Dilma) e de sexta, o governo contou com cerca de 15% de quem esteve na avenida Paulista.
Diante desses números, adquire menor importância o cálculo dos possíveis votos entre os integrantes da comissão do impeachment. Nada parece garantido a esta altura. A sociedade se agita e se divide; os escândalos se sucedem, o ambiente econômico balança ao sabor das expectativas de cada hora.
É certo, no entanto, que eventual vitória de Dilma Rousseff na comissão parece a cada dia mais impossível. E o plenário da Câmara, que deverá votar o relatório final no máximo até maio, está longe de apresentar-se como favorável ao petismo, ainda mais sofrendo irrefreável pressão das ruas.
editorial da Folha de São Paulo
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