segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

MPF reforça pedido de condenação de Vaccari

O Ministério Público Federal reforçou o pedido de condenação do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e do ex-diretor da Petrobras Renato Duque por 24 atos de lavagem de dinheiro envolvendo pagamentos de propina ao Partido dos Trabalhadores através de contratos falsos firmados com a Editora Gráfica Atitude. Os dois investigados estão presos no Complexo Médico-Penal em Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, e já foram condenados em outros processos.
“As provas constantes dos autos apontam que, em sua atuação no âmbito da empresa e da agremiação política que representavam, notadamente, Petrobras e Partido dos Trabalhadores, os denunciados se utilizaram do crime de lavagem de dinheiro de maneira sistemática e não-acidental”, afirmam os procuradores, nas alegações finais da 10ª fase da Operação Lava-Jato.
De acordo com a denúncia aceita pelo juiz Sérgio Moro, parte da propina do esquema criminoso foi dirigida, a pedido de Renato Duque, a João Vaccari Neto; e outra parcela deste montante, a pedido de João Vaccari Neto, para a Editora Gráfica Atitude.
Segundo os procuradores, a Gráfica Atitude tem por sócios sindicatos vinculados ao PT. Para dar aparência legal à fraude, as empresas de Augusto Mendonça firmaram dois contratos fictícios com a gráfica, sediada em São Paulo, mas os procuradores sustentam que os serviços nunca foram prestados.
Nas alegações, o MPF solicitou ainda a suspensão do processo em relação ao acusado Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, ex-executivo da Toyo Setal e delator da Lava-Jato, devido ao acordo firmado de delação premiada.
No documento, o MPF também pediu a devolução, para a Petrobras, de recursos avaliados em R$ 4,8 milhões que teriam sido desviados no esquema de corrupção. (Com G1)
Presos em Curitiba, ex-tesoureiro e Renato Duque são investigados por lavagem de dinheiro
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Os filhos de Gandhi

Desde o moralismo republicano instaurado pela Revolução Francesa, no século 18, a vida privada de homens públicos se tornou uma questão política. Ninguém nunca deu bola para o comportamento doméstico dos césares de Roma, os malfeitos dos reis ingleses nunca foram da conta de ninguém. Mas, com a República, onde ninguém toma o poder por escolha divina, a responsabilidade pública dos eleitos passou a exigir deles uma vida reta. Num regime de representação popular, o cidadão deseja e sempre supõe ser representado por alguém melhor do que ele.
No século XX, alguns líderes populares foram tratados como “santos”, por seu comportamento pessoal percebido como elevado. Mas se tornaram tiranos cuja violência, intolerância e ausência de sentimentos eram justificadas pela pureza salvacionista e o rigor autoimposto. Tiranos como Hitler, Stálin, Salazar, Franco, Mao, viveram com exibicionismo vidas ascéticas, cultivando racionalidade religiosa, reivindicando solidão monástica e redentora. Como eram puros, tinham direito a tudo.
Desculpem a autocitação, mas não posso deixar de lembrar o que escrevi aqui, nessa coluna, em outubro do ano passado. “Vindo da arcaica miséria nordestina para a moderna indústria paulista, da luta sindical à resistência democrática à ditadura, Lula tornou-se um avatar do povo brasileiro. Ostensivamente pobre, descabelado e barbudo, mal vestido como um penitente, Lula ganhou a confiança de quem o sentia um igual. (...) Vendo Lula tomar posse no início do primeiro mandato, me senti diante de um líder nacional (que) podia ser o nosso Gandhi ou o nosso Mandela, o amor de todos”.
Logo vi Lula menosprezar publicamente a origem simbólica de seu poder, afirmando que preferia vestir o terno e gravata que usava agora, em vez do macacão de operário de toda a sua vida. Como cidadão, ele tinha (e tem) todo o direito de gentrificar-se, ficar rico, vestir o que bem entender. Mas não era isso que seus eleitores (e não eleitores) esperavam dele. Naquele mesmo artigo de outubro, sugeri que Lula ouvisse José Mujica, o ex-presidente uruguaio: “Quem quiser ganhar dinheiro, que o faça, não é crime; mas longe da política”.
Não conseguimos imaginar um líder popular como Mahathma Gandhi passando seus fins de semana num luxuoso sítio em uma Atibaia local; ou que Nelson Mandela namore um tríplex na praia do Guarujá de Capetown. Até Bernie Sanders, o fenômeno socialista nas eleições americanas, não anda de carro com motorista, costuma viajar de ônibus entre as cidades que visita em campanha e, quando elas são distantes, em classe econômica de aviões comerciais. E não o faz por cinismo ou demagogia, mas em respeito ao país simbólico que deseja representar.
Todo mundo tem direito à mobilidade social e ao prazer pessoal. Mas enquanto houver um só miserável, um só morto de fome entre os brasileiros, os que pretendem representá-los não podem exibir vida semelhante à de seus inimigos declarados. Foi isso que escolheram fazer na vida — não ser mais do mesmo. Se não, qual a diferença real ou simbólica entre uns e outros?
Menos popular, Fernando Henrique Cardoso também foi um presidente bem-sucedido. Os 18 anos entre Itamar Franco e o último mandato de Lula foram a idade de ouro de nossa República, na rota da consolidação da democracia, do controle da inflação, do crescimento econômico, da distribuição de renda, do acesso da população a bens inéditos para ela. A chegada de FHC ao poder foi, para todos, a chegada à Presidência da inteligência moderna, da probidade universitária, da competência intelectual. Foi como se Ruy Barbosa, com todas as mudanças do tempo, tivesse sido finalmente eleito.
Talvez por ingenuidade, sempre desejei ver Lula e FHC juntos, do mesmo lado. Até um tempo atrás, eu mantinha, pregada na cortiça ao lado de minha mesa de trabalho uma foto de jornal em que os dois se cumprimentavam calorosos e sorridentes (acho que num hospital em que um deles visitava o outro). Sonhei que, um dia, o Brasil talvez merecesse ter Lula como o melhor presidente de nossa história e FHC, seu competente e iluminado primeiro-ministro.
Se Lula não compreendeu seu papel como líder popular, FHC também não compreendeu o seu como agente de uma elevação do nível intelectual de nossa política. Quem escolhe a vida pública não pode ter uma vida privada pouco exemplar. Além disso, FHC não podia ter caído na tolice infantil do impeachment da presidente, a mesma bobagem irresponsável e deflagradora de conflitos irreparáveis tentada contra ele, pela oposição que hoje é governo. Uma histeria antidemocrática, como um dono da bola que tira a bola de campo quando o andamento do jogo não lhe convém.
Diferentemente do romance de Mark Twain, o Principe e o Plebeu de nossa política contemporânea desapontaram os que esperavam deles um certo heroísmo. A vida pública não é uma fé religiosa, mas também não pode ser apenas um espetáculo de teatro. Nela é preciso ser e parecer ser.
Cacá Diegues é cineasta
Se Lula não compreendeu seu papel como líder popular, FHC também não compreendeu o seu como agente de uma elevação do nível intelectual de nossa política
OGLOBO.GLOBO.COM|POR CACÁ DIEGUES

Do flagelo às reformas

A síndrome da ilegitimidade na política e a falta de credibilidade na economia seguem estreitando os horizontes do governo de Dilma Rousseff. Por um lado, as investigações da Lava-Jato continuam inflando a já enorme indignação da classe média com Lula, a presidente e o PT, embrulhados todos como apenas um e o mesmo mal. De outro lado, a aceleração inflacionária, o aprofundamento da recessão e a escalada do desemprego em massa empurram também contra o governo a opinião pública na base da pirâmide social. Forma-se a sopa primordial do impeachment.
Na dimensão política, é concreta a ameaça de contínuo esvaziamento da sustentação parlamentar do governo. O PMDB já estava rachado quanto à questão, tendo ensaiado um plano econômico alternativo para sua operação de desembarque. Pois bem, agora o próprio PT explicita seu estranhamento com um programa em que denuncia o afastamento de Dilma de sua plataforma eleitoral. Pouco importa no momento o mérito das propostas oferecidas. Nem mesmo se tudo não passa de um “showmício” pré-eleitoral, considerando-se o inacreditavelmente hipócrita pedido de defesa da Petrobras pelo presidente do PT. O que realmente importa é o ensaio de abandono da presidente pelo partido. Antes mesmo desse episódio, políticos que lhe eram próximos e confiáveis já a aconselhavam a sair do PT, patrocinar a reforma política e conduzir o necessário ajuste fiscal para resguardar sua biografia.
Na dimensão econômica, o desemprego percorre agora uma trajetória explosiva. O colapso da confiança em meio à disparada inflacionária mergulhou as empresas nos mares revoltos de uma recessão sem fundo. A indexação dos salários e os excessivos encargos sociais embutidos em obsoletas legislações trabalhista e previdenciária condenam o país ao afogamento pelo desemprego em massa.
Os diversos nós da crise atual devem ser desatados sob a forma de aperfeiçoamentos institucionais. O tráfico de influência e a corrupção a céu aberto são um desrespeito de políticos inescrupulosos e de maus empresários à população brasileira. O novo Poder Judiciário está comprometido em mudar essa situação. Espera-se ainda, para a proteção dos trabalhadores, que o flagelo do desemprego em massa nos leve à modernização da legislação trabalhista e do regime previdenciário.
Em meio a uma recessão sem fundo, a indexação dos salários e os excessivos encargos sociais condenam o país ao desemprego em massa
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Missão difícil

Assim que, ainda no primeiro governo Lula, começaram a se multiplicar operações da Polícia Federal contra criminosos de colarinho branco — empresários sonegadores, por exemplo — e, em seguida, esquemas de corrupção, surgiu a discussão se esses casos estavam se multiplicando ou era a PF e o Ministério Público que se tornavam mais ativos. Os lulopetistas costumam se vangloriar de que é com eles no poder que esquemas têm sido desbaratados por organismos de Estado. Ora, não faria sentido, por ilegal, o Executivo tentar imiscuir-se no Ministério Público, cuja independência está inscrita na Constituição. Nem tampouco manipular a PF para proteger companheiros ou atacar adversários, pois a instituição goza de autonomia operacional.
O próprio ex-presidente Lula não esconderia a irritação com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ex-deputado petista, superior hierárquico da PF, por não gerenciar a atuação da polícia na Lava-Jato e adjacências. Mas Cardozo nada pode fazer. Nem parece querer, até para preservar a biografia. De resto, tem algo de ridículo o campeonato disputado entre oposição e PT para saber qual o partido mais corrupto. Esta é uma discussão inútil. O essencial é que, desde o escândalo do mensalão do PT, no qual a Procuradoria-Geral da República deu demonstrações de competência, as instituições republicanas têm dada provas de vigor crescente. Neste caso mesmo, um plenário do Supremo constituído, na maioria, por ministros indicados pelos dois presidentes petistas, condenou a cúpula do PT que subiu a rampa do Planalto com Lula, em 2003 — José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares, João Paulo Cunha. Só não julgou, e certamente condenaria, o principal personagem do mensalão mineiro, do PSDB, Eduardo Azeredo, porque ele renunciou ao mandato de deputado federal por Minas. Azeredo, governador do estado, tentou reeleger-se usando a tecnologia de lavagem de dinheiro do lobista disfarçado de publicitário Marcos Valério. A mesma que Valério emprestaria ao PT e a aliados. O ex-deputado e ex-governador conseguiu o que queria: com a renúncia, perdeu o foro privilegiado. Mas já foi condenado em primeira instância. Se for em segunda, será preso, como determina a nova regra.
O PT se vitimiza, denuncia que é alvo de um “golpe”, de uma bizarra aliança entre imprensa profissional, Justiça e Ministério Público para derrubar a presidente Dilma. Mas a imprensa noticia denúncias que o MP, de forma coordenada com a PF, encaminha ao juiz Sérgio Moro.
E são fatos estonteantes. Saqueada, a Petrobras já registrou em balanço R$ 6,2 bilhões correspondentes a perdas com a corrupção instalada dentro da empresa pelo lulopetismo. No mensalão foram “apenas” R$ 140 milhões, e já se constituiu um ruidoso escândalo. É tarefa inglória para o lulopetismo denunciar golpe quando tudo tem sido feito dentro da lei. Mesmo recursos contra atos do juiz curitibano têm sido rejeitados nas instâncias superiores da Justiça, quase na totalidade. E pelas características dos escândalos nestes 13 anos de PT no Planalto, é missão difícil defender o partido.
TEMA EM DISCUSSÃO: O combate à corrupção nos governos do PT
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Roque Sponholz | Humor Político - Rir pra não chorar

domingo, 28 de fevereiro de 2016

"PT e Dilma",

O aniversariante do dia está há 13 anos no poder e se preparou para a festa formulando um “plano de emergência econômica”. Isso confunde. Afinal, planos de emergência são formulados pela oposição, quando se convence de que o governo levou o país para a bancarrota. O partido que nos governa quer propor soluções emergenciais contra os efeitos de sua própria política.
Confuso. O PT quer salvar o país dos efeitos do que fez. Melhor não. Quem nos trouxe até aqui não saberá nos tirar. Seu conjunto de convicções econômicas foi posto em prática por 13 anos, tem um horizonte de mais três anos e, a menos que o partido mude completamente, o que ele receitará será mais da mesma política que nos arruinou.
Vasculhe-se a história econômica do Brasil e não se encontrará queda tão intensa quanto esta. Dois anos seguidos com recessão de 4%. Até o fim de 2017, o país terá tido quatro anos de estagnação ou queda. A inflação em dois dígitos trazendo de volta o fantasma de um inimigo contra o qual lutamos por décadas. A dívida subindo, e o desemprego crescendo.
Não há ambiente mais deletério do que o desemprego. Ele ameaça as famílias com a desorganização financeira e o medo. Quem não foi diretamente atingido teme ser a próxima vítima. O desemprego tem crescido ao nível anual de 40% quando se comparam os dados recentes com os de um ano atrás. O Brasil tem duas estatísticas. Uma delas deu 7,6% esta semana, mas este indicador, a Pesquisa Mensal de Emprego, está saindo de linha. Deixará de ser divulgado no mês que vem porque investiga o que se passa em apenas seis regiões metropolitanas. O outro indicador marca 9% de desemprego e este, a Pnad Contínua, permanecerá medindo o que se passa em 3.500 cidades brasileiras. Nesse indicador, o aumento do desemprego foi de 2,7 milhões de pessoas de um ano para o outro, e as projeções são de que, no mínimo, um contingente da mesma magnitude engrossará o exército de desempregados durante este ano de 2016.
O país precisa de um plano de emergência econômica, mas ele não pode ser formulado pelos mesmos que nos trouxeram até aqui. Num processo doentio de dupla personalidade, o PT diz que não é dele a atual política. Quando a infeliz Nova Matriz Macroeconômica, de matriz petista, era implantada, o partido se vangloriava de “nunca antes neste país”. Os que alertaram para os riscos daquele caminho foram hostilizados. Agora que as previsões do fracasso se confirmaram, o PT diz que não é dele a política de Dilma. Seria, se fossem outros os indicadores.
A presidente e o PT vivem um casamento complexo. Estão juntos na saúde, mas na doença se separam. Na crise, o PT dá seguidos sinais de que o plano de emergência da sigla é se salvar, acusando o governo da petista Dilma. Um casamento com separação de corpos.
Esta semana, a separação do casal PT-Dilma levou o presidente do PT, Rui Falcão, a chamar de “atentado à soberania nacional” o projeto que retirou a exclusividade da Petrobras nos campos do pré-sal. O governo Dilma apoiou a proposta do senador José Serra, e ela foi aprovada no Senado. Falcão não considera atentado a incalculável destruição de riqueza que a gestão petista, pelos caminhos escolhidos ou por descaminhos, impôs à estatal. Ele se ofende apenas com a proposta de o país se adequar à realidade dos cofres exauridos da Petrobras, permitindo, caso a estatal não queira operar os campos, que eles sejam licitados para outras empresas. A reação do partido é uma forma de tentar alcançar o imaginário popular que liga o monopólio da Petrobras à soberania nacional, mas também de se distanciar um pouco mais de Dilma.
Nos ciclos vividos pelo presidencialismo de coalizão, o poder atrai. Quando está tudo bem, é fácil para o chefe do governo atrair os integrantes da sua coalizão mesmo quando a pessoa que exerce o cargo não tem as habilidades de liderança, como é o caso. O inverso acontece nos momentos de baixa, porque a perda do poder afugenta. É o que se vive desde o momento em Dilma despencou nas pesquisas de opinião. Esta semana o PMDB falou como oposição no seu programa, mas pelo menos disse a frase “erros que nós cometemos”. O PT quer se separar de Dilma sem sequer admitir os erros que juntos cometeram.
por Miriam Leitão Com O Globo

‘Nada há de banal nessas condutas’, diz Moro ao ‘esticar’ prisão de marqueteiro de Lula e Dilma

Ao prorrogar por mais cinco dias a ordem de prisão temporária do publicitário João Santana e da mulher e sócia dele Mônica Moura – marqueteiros das campanhas presidenciais de Lula (2006) e de Dilma (2010 e 2014) -, o juiz federal Sérgio Moro cravou que não considera ‘banal’ o crime de evasão de divisas atribuído ao casal.
Moro destacou que ‘não reputa tão insignificante assim este delito’.
O juiz renovou a custódia de João Santana e Mônica Moura acolhendo pedido da Polícia Federal e da Procuradoria da República. O marqueteiro e a mulher e sócia estão presos desde quarta-feira, 24, quando retornaram de viagem à República Dominicana.
Inicialmente, a Operação Acarajé, 23.ª fase da Lava Jato, impôs ao casal cinco dias de prisão temporária, prazo que venceria domingo, 28. Nesta sexta, 26, Moro esticou por mais cinco dias a permanência de João Santana e Mônica Moura na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, base da missão Lava Jato.
No despacho de prorrogação da prisão, Moro fez uma alusão à manifestação pública da defesa do casal, segundo a qual João Santana e Mônica Moura ‘estão presos por manutenção de conta não declarada no exterior, um crime pelo qual não existe uma pessoa presa nesse País’.
Trecho do despacho do juiz Sérgio Moro, que prorrogou prisão de João Santana
Trecho do despacho do juiz Sérgio Moro, que prorrogou prisão de João Santana
“Não vou dizer que é um crime leve, mas é um crime que não enseja a prisão de qualquer cidadão”, afirmou o criminalista Fábio Tofic Simantob, após o depoimento de Mônica na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, na quarta, 24.
Em seu despacho pela prorrogação da temporária, o juiz anotou. “Muito embora a ilustre defesa de João Santana e Mônica Moura tenha argumentado que o único crime por eles cometido seria o de evasão fraudulenta de divisas, na modalidade de falta de declaração de ativos no exterior (artigo 22, parágrafo único, da Lei 7.492/1986), este Juízo não reputa tão insignificante assim este delito.”Baseado em dados levantados pela PF e pelo Ministério Público Federal, que apontam pagamentos milionários da empreiteira Odebrecht a João Santana e Mônica Moura, o juiz esticou por mais cinco dias a custódia do casal. “Mais relevante, há indícios, como já apontados, de que os investigados podem estar incursos em práticas delituosas bem mais graves, como lavagem de dinheiro e corrupção”, anotou Sérgio Moro. “Não vislumbro ainda como banalizar a prática de fraudes, com utilização de recursos escusos ou pelo menos nãocontabilizados, em campanhas eleitorais, quer no Brasil ou no exterior, considerando a consequente afetação da integridade do processo político democrático. Nada há, portanto, de banal nessas condutas.”

Atolado no lamaçal da corrupção que comanda, Lula tenta se defender. Diz que foi intimado e terá sigilos quebrados

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou seu discurso na festa de aniversário de 36 anos do PT para fazer sua primeira defesa pública das suspeitas de ter sido favorecido por empreiteiras em imóveis no interior de São Paulo. O petista disse não ser dono das duas propriedades investigadas e atacou o Ministério Público e a Polícia Federal.
Pela primeira vez, o petista disse publicamente ter recebido o sítio em Atibaia de presente de seu amigo Jacob Bittar, ex-prefeito de Campinas. "Ele inventou de comprar uma chácara para que eu pudesse descansar depois que eu deixasse a Presidência. E fizeram uma surpresa pra mim. Ficou em segredo até o dia 15 de janeiro", afirmou.
Em relação ao tríplex em Guarujá, no litoral paulista, em que há suspeitas favorecimento pela construtora OAS, ele disse não ter relação com a propriedade."Eu digo que não tenho o apartamento. A empresa diz que não é meu, e um cidadão do Ministério Público, obedecendo ipsis litteris a Globo, que costuma dizer que o tríplex é meu", apontou, depois de ironizar o imóvel como "tríplex Minha Casa Minha Vida".
Lula disse que parte do Ministério Público se subordina à imprensa e afirmou que "as pessoas que se subordinam dessa forma não merecem o cargo que estão no país, concursadas para fazer justiça, para investigar".
O ex-presidente informou ainda ter recebido uma intimação, dando conta de que terá seus sigilos bancário, telefônico e fiscal quebrados, mas não especificou o que motivou a ordem. "Se esse for o preço que a gente tem que pagar para provar a inocência, eu faço".
"Só quero que depois me deem um atestado de idoneidade."
Conclamando os militantes a não "baixar a cabeça", Lula disse que os petistas "não podem levar desaforo para casa todas vez que falarem merda da gente". E disse que acabou a fase "Lulinha paz e amor", expressão cunhada na campanha de 2002, diante da mudança de perfil em relação às eleições anteriores.
"Eu queria dizer a eles (os adversários do PT): vocês não vão me destruir, vamos sair mais fortes dessa luta."
O petista saiu em defesa da sucessora, Dilma Rousseff, que, em um dos momentos de maior tensionamento com o PT, não compareceu à festa de aniversário da sigla, mas apontou que ela tem que ter certeza de que "o lado dela é esse".
"Por mais que possamos ter divergências com qualquer pessoa do governo, esse governo é nosso e temos responsabilidade de fazer dar certo. A gente tem que ter claro e a Dilma tem que ter certeza é que o lado dela é esse e ela precisa de nós para sobreviver aos ataques que vem sofrendo no Congresso."
PAULO GAMA/NICOLA PAMPLONA- Folha de São Paulo

"A Odebrecht é boa alma?",

É curioso, mas não vi em lugar nenhum resposta para uma pergunta óbvia: por que a Odebrecht faria polpudos pagamentos no exterior para a firma do marqueteiro João Santana e de sua mulher Mônica Moura, conforme ela própria confessou?
Uma resposta poética seria mais ou menos assim: uma empresa de bom coração resolveu, do nada, garantir a um simpático baiano, como quase todos os baianos, uma aposentadoria luminosa.
Pena que bom coração não consta do DNA do capitalismo. Consta, sim, o lucro.
Logo, a sabedoria convencional manda dizer que os pagamentos a Santana se deveram ao fato de que ele ajuda a eleger governantes que, uma vez no poder, concedem obras públicas à empreiteiras como a Odebrecht.
A história universal é prenhe de exemplos de corrupções várias envolvendo a concessão de obras e serviços públicos.
No Brasil, então, as suspeitas eram permanentes até que Janio de Freitas demonstrou que havia mais, muito mais, do que suspeitas. Relembrando: o colunista publicou, disfarçado nos classificados do jornal, o que seria o resultado da concorrência para a Ferrovia Norte-Sul, no já remoto governo José Sarney.
A concorrência foi anulada, mas o flagrante não impediu novos trambiques, como os que agora estão escancarados no caso Petrobras.
Revisemos o retrato dos países em que Santana fez campanha: todos os três (Angola, Venezuela e República Dominicana) conseguem a proeza de ficar atrás até do Brasil no ranking da Transparência Internacional, que mede a percepção de corrupção. Angola é o caso mais escandaloso: 163º lugar de 167 países. A Venezuela não está longe: 158º. Mesmo a República Dominicana está além do centésimo posto (103º).
É natural, nessas circunstâncias, que a sabedoria convencional esteja certa ao supor que a Odebrecht pagou a Santana por ajudar a eleger governantes, digamos assim, sensíveis a interesses da empresa.
É bom lembrar que José Eduardo dos Santos governa Angola desde 1979; o "chavismo" está no poder na Venezuela há 16 anos; e Danilo Medina está disputando a reeleição na República Dominicana.
Ter um amigo muito bem pago com prestígio junto a governantes desse naipe é um belo investimento, certo?
Pois é. Acontece que o Brasil não é exatamente um país bem situado no ranking da Transparência (76º lugar). Acontece também que o Brasil é governado pelo mesmo partido, o PT, desde 2003. Ter um amigo influente também nesse país não é um bom investimento?
Logo, não há como deixar de suspeitar que a Odebrecht tenha feito pagamentos por baixo do pano também pelas campanhas de João Santana no Brasil.
O advogado do marqueteiro já admitiu, diante das câmeras de TV, que Santana/Mônica cometeram "crime tributário", vulgo caixa 2.
Lula também admitiu o caixa 2 ao falar na TV sobre o mensalão à época. E, sempre é bom lembrar, seu ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, disse a propósito que "caixa 2 é coisa de bandido".
É nesse sórdido ambiente que o Brasil está vivendo.
 por Clóvis Rossi Folha de São Paulo

"Ataque a Lula, Dilma e até Cunha",

Há semanas de guerra fria e de guerra quente nestes dois anos em que o país vem se desmilinguindo. A guerra quente recomeçou na semana passada; a que virá será também de tiro, pancada e bomba.
Há um rumor persistente, lá de Curitiba, a respeito de uma ofensiva policial maior contra Lula e família. Além do mais, o ex-presidente foi intimado a depor sobre sítio e tríplex no Ministério Público de São Paulo, na quinta-feira (3).
O governo terá de lidar com um PT que acaba de condenar o plano econômico de Dilma Rousseff (reforma da Previdência e contenção legal de gastos do governo).
Sem o apoio do PT, vão-se alguns dos últimos fiapos de esperança de dar rumo ao governo da economia. A tentativa de Dilma 2 de assoviar e chupar cana, de satisfazer PT e o dito "mercado", não tem dado certo.
Os tiros contra o programa Dilma 2 tiveram o aval de Lula. As relações do ex-presidente com sua afilhada são descritas como "frias" no entorno luliano. Lula, de resto, voltou a dizer que quer ver pelas costas o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, "mole com a Polícia Federal".
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, foi triturado nas conversas da direção petista, reunida na sexta-feira (26) no Rio. O partido pregou o aprofundamento da política econômica dos anos Lula: o oposto do vago programa de Dilma 2.
Haverá o começo do estrebuchamento de Eduardo Cunha. Na quarta-feira (2), o Supremo Tribunal Federal deve transformar o presidente da Câmara em réu, acusado de receber propina do petrolão na Suíça. Quando se debate na lama em que atolou, Cunha espalha estilhaços.
Uma decisão crucial do Supremo na prática deve favorecer delações premiadas e um pique acelerado nesse jogo de denúncias. Condenados em segunda instância começam a cumprir pena na prisão, se for o caso, decidiu o STF faz dez dias.
Por acaso, nesses dias foi preso João Santana. A defesa do publicitário tem apertado o garrote de Marcelo Odebrecht: Santana troca suas penas por acusações à empreiteira. A perspectiva de cadeia pode revelar muito das relações da empresa com a campanha da reeleição de Dilma Rousseff.
Por falar em campanha, o TSE acaba de demandar investigações sobre empresas prestadoras de serviço para Dilma 2014, no mínimo outra fonte potencial de vazamentos sensacionais e convulsão político-policial.
Há rumores de mais escândalo em fundos de pensão e de mais batidas contra empresas acusadas de pagar propina para sonegar (Zelotes).
Na quinta, o IBGE divulga o crescimento do PIB em 2015. O anúncio não terá coisas boas nem coisas novas, uma recessão entre 3,5% e 4%, mas vai fazer manchetes ruins.
Apesar de a numeralha econômica do início do ano confirmar as previsões sombrias para 2016, há tímida melhoria de ânimo do consumidor. Não se entende bem o motivo, pois a inflação ainda está alta; emprego e renda baixam agora mais rápido. De qualquer modo, será difícil ver recuperação do prestígio da presidente, pelo menos enquanto durar essa temporada de guerra quente.
A Lava Jato faz dois anos no dia 17 de março, na mesma semana em que o PMDB pode tirar mais um pedaço do pé da canoa de Dilma Rousseff, ainda que alguns dos chefes do partido estejam quase afogados.
por Vinicius Torres Freire Folha de São Paulo

"Todo mundo gosta de acarajé",

"Tio Bel, você consegue me fazer chegar mais 50 acarajés na quarta-feira à noite, no escritório?". "Ok, programado, seus acarajés chegaram [sic] quentinhos."
A conversa por e-mail não envolvia sobrinhos gulosos ou produtoras do saboroso quitute baiano. Eram executivos da Odebrecht combinando a entrega de dinheiro vivo, segundo investigadores da PF.
O acarajé saiu do tabuleiro para batizar a 23ª fase da Lava Jato, que prendeu o marqueteiro João Santana. Como o Brasil é o país da piada pronta, já surgiram protestos contra o uso do nome da iguaria.
A Associação Nacional dos Produtores de Acarajé reclamou de prejuízos ao setor. É perda de tempo, porque ninguém mudou o jantar de domingo depois de ler que um escândalo terminou em pizza.
Em Brasília, a prisão de Santana animou quem vive à espera de qualquer fato novo para tentar derrubar o governo. O PSDB se antecipou à Justiça Eleitoral e decretou o fim do mandato de Dilma Rousseff. O PMDB voltou a sonhar com o impeachment, que levaria Michel Temer e sua turma ao Planalto.
O ministro Gilmar Mendes, sempre ele, deu declarações em tom grave. "Se isso estiver associado à campanha, é de seriedade inexcedível", disse, na terça-feira.
Três dias depois, o juiz voltaria a fabricar manchetes contra o governo.
Os efeitos da operação na política ainda são incertos, mas os marqueteiros já acusaram o golpe. Até outro dia, eles reclamavam do veto ao financiamento empresarial de campanhas. Agora isso parece ter se tornado um problema menor.
Chocados com a prisão de Santana, alguns publicitários já falam em abandonar o negócio milionário das eleições. Quem ficar terá que se adaptar a uma nova era, de menos dinheiro e mais fiscalização sobre as contas. É uma boa hora para ouvir a canção de Caymmi: "Todo mundo gosta de acarajé / O trabalho que dá pra fazer é que é."
por Bernardo Mello Franco  Folha de São Paulo

"O tapete vermelho",

Entre as coisas que não entendo —quase todas— estão os critérios ou a falta de critérios das premiações em geral, desde a do prêmio Nobel ao Oscar que anualmente a Academia de Hollywood distribui aos que se destacaram nas várias categorias que compõem um filme: roteiro, ator, atriz, diretor, coadjuvante etc.
Em linhas gerais, os premiados ganham status e, de certa forma, criam uma expectativa de qualidade ou emoção, que acaba valorizando o filme e os que nele trabalharam. E, evidente, não só o Oscar, mas o cinema norte-americano continua sendo o mais influente e copiado em todo o mundo.
Periodicamente, surge um movimento como o expressionismo alemão ou o neo-realismo italiano, ambos penetraram no próprio cinema de Hollywood, mas o arroz e feijão da indústria cinematográfica continua a ser a norte-americana e pode ganhar qualquer prêmio pelo conjunto de obra.
Apesar de sua influência internacional, numa lista dos cem melhores filmes de todos os tempos, os festivais mais importantes, como o de Cannes, Veneza e Berlim costumam premiar produções de outros países, inclusive alguns exóticos.
Como em todas as avaliações, inclusive na ciência, na literatura e até na paz, as injustiças e os equívocos, sobretudo a influência política ou ideológica, nem sempre distinguem os melhores ou os mais importantes.
Só no fim da vida, arrastando os pés e sem dar muita bola à cerimônia, Chaplin só ganhou o prêmio referente ao conjunto de obra, ao som de uma de suas músicas que até hoje é cantada em boates, festivais, casamentos e até nas igrejas.
São raras as exceções. Mais raro ainda é o consenso universal sobre determinado prêmio. Aos poucos, o tapete vermelho, que se torna a passarela da fama, está superando o próprio cinema.
por Carlos Heitor Cony Folha de São Paulo

Após três décadas, risco de calote volta a assombrar economia brasileira

Economistas de todas as correntes desenterraram uma discussão que parecia superada na história das finanças nacionais: o Brasil pode quebrar, como aconteceu na década de 1980? Nas duas últimas semanas, afora as conversas informais, pelo menos cinco relatórios de diferentes instituições abordaram esse tema. O temor é alimentado por uma constatação: o País é hoje assombrado por uma nefasta combinação de recessão profunda e aumentos desenfreados de gastos e dívidas. Pelas mais recentes projeções, a economia encolheu 4% no ano passado e deve sofrer nova contração em torno de 4% este ano. A deterioração pode ser vista em todos os lados da sociedade. No ano passado, cerca de 100 mil lojas fecharam as portas no Brasil. O número de postos de trabalho fechados chegou a 1,5 milhão e o total de pessoas desempregadas no País já atinge 9 milhões, um recorde. Cerca de 1 milhão de alunos trocaram as escolas privadas pelas públicas, e é crescente a quantidade de pessoas que perdem os planos de saúde e têm de recorrer ao SUS, com todas as dificuldades de atendimento.
A atividade econômica em queda vai reduzindo as receitas com impostos e ampliando o rombo nos caixas da União, dos Estados e dos municípios. Hoje, não há economista que olhe para esses números e não se preocupe, em especial com a trajetória da dívida pública, que está hoje em 66% do PIB e pode chegar perto dos 90% no ano que vem, segundo alguns analistas. 
O governo garante que não há risco de insolvência e que tem adotado todas as medidas possíveis para estabilizar a dívida pública. Há uma grande preocupação principalmente com a escalada do aumento dos gastos com a Previdência Social. Mas o governo enfrenta dificuldades em encontrar apoio dentro do seu próprio partido para mudar esse cenário.

OS BOIS DE PIRANHA E A FESTA DO PT


Na década de 1990, surgiram os sem-terra na área rural. Mais adiante, vieram os sem-teto na área urbana. Pois agora está em gestação no Planalto Central a figura da presidente sem partido. Saiu Joaquim Levy, entrou Nelson Barbosa e o partido de Dilma Rousseff, o PT, continua implacável na oposição ao ajuste fiscal do governo e, portanto, à própria Dilma. Já a principal sigla da base aliada, o PMDB, retomou as articulações para o impeachment.
Durma-se com um partido desses! Ou com partidos como esses! Dilma, que já tem (e criou) problemas de sobra, deve estar dando uns bons gritos, roendo as unhas e xingando a mãe de muito petista por aí, inclusive de um tal Quaquá, presidente do PT do Rio, que deixou claro que não fazia a menor questão da presença da presidente, ontem, no aniversário do partido.
Conclusão: Dilma não queria ir à festa do próprio partido, nem o próprio partido queria Dilma num encontro com dois objetivos: atacar Dilma e defender Lula. Os bois de piranha, nos dois casos, foram os ministros Barbosa e José Eduardo Cardozo.
Já na sexta-feira, o PT mandou seus recados contra o que Levy dizia e Barbosa continua dizendo sobre a necessidade de uma política econômica responsável, capaz de fechar as contas públicas, equilibrar receitas e despesas e estancar a trajetória de queda do Brasil e dos brasileiros – sobretudo dos mais pobres – no precipício.
Segundo resolução que passou pelo Diretório Nacional, o PT “só apoia medidas pactuadas com o sindicalismo, as organizações populares e os movimentos sociais”. Ou seja, o PT se volta de costas para o seu governo e de frente para os movimentos aliados. Só topa qualquer coisa com o viés populista e sem nenhum traço de responsabilidade e pragmatismo. Sindicatos, organizações populares e movimentos sociais estão no seu direito, aliás, dever, de fazer pressão, mas o partido da presidente da República tem a obrigação de ir além, de pensar e agir estrategicamente.
Mas, não. Nega-se a admitir que a farra fiscal e a inflação atingem justamente os assalariados e os que dependem do Estado para saúde, educação, saneamento, infraestrutura. Para assegurar isso, dispensam-se discursos contra o “sacrifício do povo trabalhador” e exige-se a responsabilidade de traçar uma política econômica sólida, confiável, que garanta de fato bem-estar e direitos de médio e longo prazos desse mesmo povo trabalhador.
Na prática, o PT faz o oposto do que pretende: fala contra o “golpismo”, mas dá argumentos para o impeachment; defende a unidade, mas racha o governo para um lado e o partido para o outro; sabe que Lula e Dilma são indissociáveis, mas empurra um contra o outro; reconhece que há enorme fragilidade, mas opera para converter os convertidos e ignora reconquistar a maioria que debandou.
Em resumo, o partido da presidente age como se Dilma não tivesse mais jeito. Logo, toda a energia e todas as festas devem ser para renegar o presente, ressuscitar o passado e investir no futuro. Ou seja, contra Dilma, a favor de Lula. Só que... se Dilma não vai bem, porque seu governo destruiu a economia, Lula não está melhor, porque o dele explodiu a Petrobrás e permitiu uma farra com dinheiro público e com as empreiteiras num nível nunca antes visto e imaginado.
E O PMDB? Está sendo novamente empurrado para o PSDB e para a tese do impeachment, depois da prisão de João Santana – aliás, o grande ausente na festa do PT, junto com José Dirceu, Delcídio Amaral, André Vargas e uma penca de ex-tesoureiros. Se o PT é de oposição e o PMDB é uma ameaça, Dilma está perto de criar o movimento dos presidentes sem partido – e sem base, sem povo e sem credibilidade.
Festa do PT é para renegar o presente, ressuscitar o passado e investir no futuro
Parabéns pra você! O Estado de S.Paulo 28 Fevereiro 2016 | 06h 49 - Atualizado: 28 Fevereiro 2016 | 06h 49 ELIANE CANTANHÊDENa década…
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PERSONA NON GRATA


Antes de ser reconhecida pela incompetência, a presidente Dilma Rousseff ficou conhecida pelo cultivo dos maus modos. Maneira de ser, tratada pelo departamento de propaganda do Palácio do Planalto – no momento desativado e posto em desassossego nas dependências da Polícia Federal em Curitiba – como sinal de austeridade e exigência na eficácia do trabalho.
Na versão de sua assessoria, a presidente está sempre “irritada” com alguma coisa. Com o Congresso irritou-se a ponto de considerar desnecessário estabelecer relações cordiais até com parlamentares e partidos e sua base de apoio.
Com subordinados (dos mais aos menos qualificados) irrita-se ante qualquer contrariedade. Com a oposição irrita-se só pelo fato de ela existir. Com a imprensa mostra-se extremamente irritada se cobrada a falar sobre este ou aquele escândalo envolvendo sua administração. Chegou aos píncaros da irritação quando, ainda ministra, (des) qualificou como “rudimentar” a proposta dos então ministros Antonio Palocci e Paulo Bernardo para a condução da economia, cuja preliminar era o ajuste fiscal.
Agora a presidente da República está muito irritada com seu partido, o PT, que resolveu voltar às origens e negar o apoio que deu a Lula em 2003 para a adoção de medidas racionais. Com isso, cai o último bastião de defesa de Dilma. O partido não a quer. E nessa hora em que se encontra cercada de males por todos os lados, não há mais quem a queira, estão todos muito irritados com ela: se fala na TV, a presidente é alvo de panelaços, se transita por ambientes não protegidos arrisca-se a ser vaiada, quando apela ao Congresso não obtém a resposta pretendida. O empresariado não lhe tem apreço e os movimentos sociais já a tratam como inimiga.
Dilma é a “persona” menos grata da República. Não se encontra quem esteja disposto a lhe estender a mão ou nutra por ela alguma simpatia. Resultado da antipatia que semeou.
Isolada, a “rainha” não paira “sobranceira sobre os adversários” como prometeu João Santana. Antes, colhe os frutos da malquerença que com tanto afinco cultivou.
Nem Moro nem PT. Durante o período em que esteve preso, o senador Delcídio Amaral chegou a cogitar a hipótese de propor ao Ministério Público um acordo de delação premiada. A família incentivava.
Mas, pensando melhor sobre as acusações que lhe são imputadas, pesando o custo e o benefício, desistiu por considerar perfeitamente possível derrubá-las com argumentos jurídicos. Por exemplo, contestando a legalidade da gravação feita pelo filho de Nestor Cerveró (ex-diretor da Petrobrás) e argumentando que seu mal foi contar vantagem indevida ao sugerir influência sobre ministros do Supremo Tribunal Federal.
Num primeiro momento, o senador concentrará esforços em convencer seus pares em geral, e os integrantes do Conselho de Ética em particular, a não cassar-lhe o mandato. Se fizesse acordo com o MP, a preliminar seria admissão de que realmente tentou obstruir o trabalho dos investigadores, o que por si só já configuraria quebra de decoro.
Preservado o foro especial de parlamentar, Delcídio Amaral mantém prudente (na visão dele) distância do juiz Sérgio Moro. Num segundo momento, o senador cuidará de sua vida partidária. Encerrando sua carreira de petista que, hoje conclui, nunca deveria ter sido iniciada.
Conta zerada. Se o silêncio de Marcelo Odebrecht tinha como objetivo a preservação da empresa, a motivação cessou com os depoimentos de Mônica e João Santana, atribuindo à construtora a prática de ilícitos no âmbito internacional.
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O PESO DO PMDB E DAS RUAS


A cassação dos mandatos da presidente Dilma Rousseff e de seu vice Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) passa a ser uma possibilidade muito mais concreta a partir das suspeitas de ilicitudes praticadas pelo PT na campanha eleitoral de 2014, levantadas pelas investigações da Operação Lava Jato que levaram à prisão o marqueteiro João Santana e sua mulher e sócia, Mônica Moura. Essa novidade tende a provocar um natural realinhamento das forças que compõem a inconsistente base de apoio ao governo, na qual o PMDB, maior bancada do Congresso, continua tentando conciliar uma tendência crescentemente oposicionista com o desejo de preservar o poder de que desfruta na sua condição de principal aliado do Planalto.
O novo quadro político que nitidamente se esboça em Brasília tem como fulcro a possibilidade de afastamento de Dilma Rousseff e a consequente realocação das várias facções políticas no tabuleiro do poder. Mas a análise das perspectivas e a sua influência sobre a estratégia a ser adotada agora pelas facções concorrentes não podem levar em conta simplesmente a consumação da deposição da presidente da República, mas também, necessariamente, a forma como o afastamento vier a ocorrer. As possibilidades são basicamente duas, com consequências distintas.
Se o Congresso aprovar o pedido de impeachment, Dilma estará deposta e em seu lugar assumirá o vice Michel Temer. Já a punição que o TSE pode impor é a cassação da chapa completa: presidente e vice. E se isso ocorrer até 31 de dezembro próximo – metade do atual mandato presidencial – a chefia do governo será assumida por 90 dias pelo presidente da Câmara, que por enquanto é Eduardo Cunha, e nesse ínterim se realizarão novas eleições para presidente e vice. Se a cassação – não o impeachment da presidente – ocorrer na segunda metade do mandato, assume provisoriamente o presidente da Câmara e os novos presidente e vice da República serão eleitos indiretamente pelo Congresso.
Diante dessas perspectivas, dois fatores assumem importância decisiva para o destino de Dilma Rousseff: a posição do PMDB e a intensidade do apoio popular ao afastamento.
Na quinta-feira, em seu programa político na mídia eletrônica, o PMDB, apesar da ambiguidade que habitualmente marca suas posições, fez duras críticas à má gestão federal, particularmente à inflação e ao desemprego crescentes. Na abertura do programa – que não teve a participação de nenhum dos seis ministros peemedebistas – Michel Temer afirmou que “todos já sabem os motivos” da crise que o País vive. E uma locutora enfatizou: “Continuamos desiludidos. O desemprego vem de mãos dadas com a carestia (...). O brasileiro empobreceu, entristeceu e o País precisa reagir já”. Definitivamente, não é o discurso de um aliado político.
Temer está empenhado agora em garantir sua reeleição à presidência do PMDB na convenção de março. De todo modo, o caminho do TSE para o afastamento de Dilma, por razões óbvias, não lhe interessa. Isso pode significar que os peemedebistas passem a considerar com maior simpatia o processo de impeachment que tramita no Congresso, sobre o qual podem ter uma atuação decisiva.
E esse é um raciocínio que pode se estender a toda a chamada bancada aliada, na medida em que de alguma maneira ficar claro que a substituição de Dilma por Temer pode ser vantajosa no toma lá dá cá que impera nas relações do Executivo com o Legislativo.
Seja como for, o avanço do processo de impeachment no Congresso e, certamente em menor escala, o da cassação no TSE dependem muito do claro apoio popular à ideia do afastamento de Dilma Rousseff. Todas as pesquisas de opinião demonstram que a impopularidade da chefe do governo não tem precedentes na história e os indicadores econômicos e sociais estão aí a comprovar, diariamente, aquilo que as agências internacionais de avaliação de risco unanimemente apontam: o desgoverno tomou conta do Brasil.
Mas pesquisas de opinião e indicadores econômicos e sociais são dados frios, por si sós incapazes de mudar a história política de um país. Esse poder está reservado à inequívoca vontade popular livre e claramente expressa nas urnas e nas ruas, neste último caso quando legitimamente amparada pelos necessários procedimentos constitucionais.
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INGÊNUOS, MAS QUEM ACREDITA?


Era presumível que o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura fosse alegar, com a convicção dos puros, que não fazia ideia de qual era a origem da dinheirama que apareceu subitamente em suas contas no exterior – e que, para a Lava Jato, é parte da roubalheira da Petrobrás. Só isso já seria suficiente para ofender a inteligência dos investigadores e do distinto público, mas não se pode dizer que tenha sido uma surpresa. No entanto, o que saiu dos primeiros depoimentos dessa dupla do barulho à Polícia Federal concorre a um lugar de destaque na antologia que se fizer a respeito desses tempos de colapso moral sob o lulopetismo – e joga na fogueira a Odebrecht, a gigantesca empreiteira cujo nome volta e meia surge nas narrativas desse escândalo.
João Santana e sua mulher afinal reconheceram que são proprietários de uma empresa offshore em cujas contas foram depositados US$ 7,5 milhões pela Odebrecht e pelo lobista Zwi Skornicki, entre 2012 e 2014, conforme descobriu a Lava Jato. Admitiram também que nada disso foi declarado à Receita Federal. Esse surto de honestidade respeita a estratégia da defesa, que claramente busca limitar todo o caso a um mero delito fiscal – e a livrar o PT das suspeitas de que suas campanhas eleitorais foram financiadas com dinheiro sujo.
Mas nada é tão simples, afinal. Mônica Moura afirmou que as tais contas recebiam apenas pagamentos por serviços prestados em campanhas eleitorais no exterior – em Angola, no Panamá e na Venezuela. Ou seja, não era remuneração pela conhecida atuação de João Santana como competente marqueteiro do PT no Brasil. A ser verdade o que Mônica disse, significa que a Odebrecht, que supostamente era apenas doadora de campanhas eleitorais no exterior, serviu como operadora de caixa 2 para essas campanhas, pois esse dinheiro jamais foi contabilizado oficialmente.
Segundo a senhora Santana, dos US$ 7,5 milhões encontrados na tal conta, US$ 3 milhões foram depositados por representantes da Odebrecht como parte do pagamento pela campanha do caudilho Hugo Chávez, presidente da Venezuela e candidato à reeleição, em 2012. O restante, segundo o depoimento, foi depositado pelo lobista Zwi Skornicki – preso por ser operador de propinas no petrolão – e correspondia à campanha do presidente José Eduardo dos Santos em Angola. Ela disse que não sabe por que foi Zwi quem fez esse pagamento. Nenhuma prova dessas movimentações todas foi apresentada às autoridades.
Tanto Mônica quanto o marido juraram que jamais lhes passou pela cabeça que aquele dinheiro todo pudesse ter origem ilícita. E João Santana afirmou que não declarou a existência dessa conta nem do dinheiro que por ela trafegou porque “era recurso recebido em outros países” e “ele achava que não tinha problema em ser conta não declarada”, segundo seu advogado. A defesa do marqueteiro informou que Santana, candidamente, considerava esses recursos como “uma poupança no exterior” para a sua “aposentadoria”.
E que poupança. João Santana disse à Polícia Federal que recebeu US$ 50 milhões por seu trabalho na eleição de Angola. Sua mulher, por sua vez, informou que o casal amealhou US$ 30 milhões na campanha de Hugo Chávez. Não se sabe ainda o quanto disso foi pago “por fora”, mas, a título de comparação, o que Santana recebeu “por dentro” para reeleger a presidente Dilma Rousseff não passou de R$ 70 milhões, ou US$ 17,5 milhões.
Mas, segundo seu advogado, dinheiro nunca foi o foco de João Santana. Tanto é assim que ele diz que trabalha de graça para o governo, “em razão do prazer que isso lhe gera”, conforme se lê em seu depoimento. Santana, contou o advogado, é “um criador, não trabalha com a questão financeira, com questão bancária”.
O marqueteiro que ajudou a reeleger Luiz Inácio Lula da Silva em meio ao escândalo do mensalão e que emplacou duas vezes o “poste” Dilma Rousseff terá mesmo de ser muito criativo para convencer a Justiça de que é apenas um homem ingênuo.
Ingênuos Tags: Editorial Estadão, Ingênuos, O Estado de S. Paulo, João Santana, Mônica Moura, Petrobrás, Polícia Federal, Odebrecht, PT, Angola, Panamá, Venezuela, Brasil, José Eduardo dos Santos, Dilma Rousseff 28 Fevereiro 2016 | 03h 00 Era presumível que o casal de marqueteiros João Santana e Môn…
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SEM MARGEM PARA CONTINUAR ERRANDO


Com reservas de US$ 370 bilhões, o Brasil tem pelo menos um bom colete de segurança para continuar flutuando, por algum tempo, se uma nova tempestade assolar os mercados internacionais. Em recessão, com as contas públicas em frangalhos, inflação elevada e crédito reduzido ao grau especulativo pelas principais agências de classificação, o País precisa de uma dose incomum de seriedade, competência e prudência na condução da política econômica. Seria uma irresponsabilidade – e mais uma demonstração de inépcia – meter a mão naqueles dólares para formar um “fundo nacional de desenvolvimento e emprego”, mais uma bobagem concebida e gestada na cúpula do PT.
Até o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, falou contra essa proposta, apesar de sua proximidade com o partido, de seu envolvimento na formulação da desastrosa “nova matriz econômica” e de sua participação em algumas das piores decisões da presidente Dilma Rousseff. “Neste momento de maior turbulência financeira, é muito importante”, disse ele, “ter elevado estoque de reservas internacionais. Isso tem dado mais estabilidade financeira e cambial ao Brasil.” O ministro fez esse comentário na sexta-feira, na China, onde participava da reunião do Grupo dos 20 (G-20). Turbulência para valer ainda é, de fato, uma hipótese, mas a resposta foi essencialmente sensata.
O cenário internacional ainda tem mais nuvens do que tempestade, mas o Brasil é especialmente vulnerável a qualquer novo choque. Ainda na sexta-feira o Banco Central (BC) divulgou o relatório mensal das contas do setor público. Em janeiro o resultado primário, isto é, sem os juros, é normalmente positivo. Desta vez, esse resultado foi um superávit de R$ 27,9 bilhões. Isso se explica em parte pelo desempenho ainda positivo de Estados e municípios, mas principalmente por uma receita extra de R$ 11,4 bilhões, obtida com as concessões de hidrelétricas leiloadas no fim do ano. No governo central, a arrecadação dos tributos administrados pela Receita Federal foi 4,8% menor, descontada a inflação, que a de um ano antes. Isso é um claro reflexo da recessão funda e prolongada.
Mas o real desastre das contas públicas fica mais visível quando se examinam os números acumulados em 12 meses. Incluídos os juros, o déficit de todo o setor público chegou a R$ 644,4 bilhões, ou 10,82% do produto interno bruto (PIB). A média nos países da Europa, sete anos depois do estouro da bolha financeira, é inferior a 3%. Embora lentamente, esses países continuam em recuperação. Nos Estados Unidos a mais nova estimativa aponta um crescimento econômico de 2,4% em 2015, com perda de impulso no trimestre final.
A maior parte das economias desenvolvidas – e das emergentes e em desenvolvimento – tem avançado mais que a brasileira em todas as frentes. Pela medida mais ampla, a Pnad Contínua, o desemprego no Brasil estava em 9% no período de setembro a novembro, taxa superior à da maior parte dos membros do G-20. As demissões no Brasil, segundo todos os indícios, devem ter aumentado nos últimos meses e muitos analistas projetam taxas maiores que 10% em 2016.
Com déficit consolidado acima de 10% do PIB e dívida bruta a caminho de 70% e de níveis ainda mais altos nos próximos meses, o setor público brasileiro tem pouco espaço para políticas de estímulo ao crescimento. Além disso, com seus papéis classificados como lixo – junk bonds – pelas três maiores agências, a Standard & Poor’s, a Fitch e a Moody’s, o governo brasileiro deve encontrar maior dificuldade para refinanciar a dívida pública. Mesmo sem essa limitação, a perspectiva de novos aumentos de juros nos Estados Unidos complicaria o acesso ao mercado.
Não se resolvem problemas desse tipo com truques ou voluntarismo. Ao contrário: qualquer imprudência poderá tornar ainda mais difícil a rolagem da dívida pública brasileira e aproximar o País do risco de uma nova crise de insolvência, com enormes custos econômicos e sociais. É longo o histórico brasileiro de irresponsabilidades e de erros desse tipo. Pessoas com um grau razoável de informação e de bom senso deveriam ter aprendido algo sobre isso.
É tolice pensar em políticas de estímulo semelhantes à aplicada em 2009-2010. A condição fiscal do País era bem melhor naquele momento. Mas foi certamente um erro, com efeitos desastrosos nas contas públicas, manter aquela política em 2011 e nos anos seguintes – até porque a maior parte dos estímulos beneficiava uma clientela selecionada. Além disso, o efeito dessa política sobre o investimento foi muito limitado, como atestam as contas nacionais do IBGE.
Uma política mais inteligente de concessões na área de infraestrutura poderá resultar em mais investimentos e mais empregos. Novos critérios para a exploração de petróleo, com a desobrigação da Petrobrás de participar de todo projeto com um aporte de 30%, servirão para desatar os empreendimentos no setor. É infantil insistir no papel especial da Petrobrás quando a empresa, saqueada e empobrecida, é forçada, por falta de dinheiro, a restringir seus planos.
Reduzir a burocracia, simplificar os negócios e trabalhar pela abertura de mercados pode facilitar o aumento da exportação e dinamizar vários segmentos da indústria. Há políticas conhecidas e provadas para vencer a estagnação, mas para implantá-las o governo precisa ganhar credibilidade e mostrar liderança. O primeiro passo é propor uma estratégia séria para o conserto das contas públicas. Isso permitirá, adiante, uma redução segura dos juros, sem risco de repetição da bobagem cometida em agosto de 2011, quando se iniciou uma redução voluntarista da taxa básica. Esse erro abriu espaço para o aumento da inflação nos anos seguintes. As perspectivas seriam menos assustadoras se a presidente Dilma Rousseff desse algum sinal de haver aprendido com os erros e desastres. Nenhum sinal desse tipo surgiu até agora.
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VIAGEM SEM VOLTA


A lição vem de Einstein: “A mente que se abre para uma nova ideia não retorna ao tamanho primitivo”. A significar – penso – que um entendimento mais aberto ou arejado das coisas opera no indivíduo uma transformação. Mais que uma simples mudança de ordem subjetiva, uma conversão. O alcance de um mais elevado patamar de compostura humana ou de um superlativo modo de ser. Muito mais que eventual modificação de comportamento, o salto de uma visão de mundo para outra completamente distinta. Nova e superior cosmovisão, portanto. Algo assim como Shakespeare a dizer que “transformação é uma porta que se abre por dentro”. Uma porta que se abre para possibilitar até mesmo o visual do absoluto. Que já é o vislumbre do ponto de unidade entre o infinito e o eterno. Num grau de impactação tão forte que leva a pessoa natural a empreender uma viagem de qualidade que já não comporta retorno.
Reitero, porém, que esse clarão de consciência opera no plano individual. Por isso que passível de numerosas causas. Umas internas ao ser humano, outras externas, além do que insuscetíveis de hierarquização. Seja como for, são fontes de transmutação subjetiva que bem correspondem à ideia de salto quântico. Tal a rapidez e a radicalidade com que pode ocorrer a troca de um estado de ser para outro. Feito ondas a irromper no lugar de partículas da matéria subatômica dos prótons, elétrons e nêutrons. Eterno reino da subitaneidade, portanto. Ou do não se dar à fraqueza do pré-aviso em absolutamente nada.
Pois bem, não é assim no plano coletivo. O corpo social é muito mais pesado que o corpo individual – pondero – para experimentar saltos quânticos. Não é pelo princípio da subitaneidade que se dilata a consciência das sociedades humanas. Elas somente se abrem para o fenômeno da evolução, não da transformação. Dando-se que evolução é algo processual, gradativo, paulatino. Implica metamorfose, sim, mas daquele tipo experimentado pela rastejante lagarta, que passa pelas necessárias fases do casulo e da crisálida, antes da chegada ao estado de borboleta. Noutro dizer, evolução coletiva é sempre embate de culturas, a mais velha a oferecer todo tipo de resistência à mais nova. A velha e carcomida cultura ou ordem social antiga a não querer jamais abrir mão dos seus privilégios. Espécie de luta de boxe em que a vitória da nova e mais qualificada ordem é certa, mas sempre por pontos. Nunca por nocaute.
O bom desse meu entendimento das coisas é que, no Brasil, há quase 31 anos não cessa de reluzir no horizonte da consciência coletiva o astro rei de nome “democracia”. Uma democracia republicano-federativa que se faz, de ponta a ponta da Constituição de 1988, o princípio jurídico-político de maior hierarquia. Aquele princípio que, em todo o mundo civilizado, é sinônimo de humanismo. O único princípio capaz de conciliar centralidade individual e coesão social. Embora ciente de que não tem como triunfar num simples estalar de dedos ou num piscar de olhos. A sociedade não troca de cultura como quem troca de camisa, insisto na comparação com o indivíduo. Mas é perceptível que a nova ordem democrática brasileira mais e mais municia de informações os brasileiros e estrangeiros residentes no País. Mais e mais expande as fronteiras da cidadania para dotá-la de espírito crítico. Para fazer distinções que também habilitam o homem comum do povo a exigir de todos os agentes estatais, especialmente dos governantes, que façam o jogo da Constituição. O jogo da verdade constitucional. Por que assim?
Bem, é que fazer o jogo da verdade constitucional corresponde à abertura da coletividade para ideias que, no referido âmbito do indivíduo, promovem uma viagem de qualidade sem volta. Listo algumas, que penso rimadas com os respectivos princípios e regras:
1) A Constituição governa permanentemente quem governa transitoriamente;
2) o imperioso combate à impunidade tributária e penal propriamente dita começa com a rigorosa observância do enunciado republicano de que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”;
3) as instituições públicas dividem-se em instituições que governam (Executivo e Legislativo) e instituições que não governam, mas impedem o desgoverno (polícia, Ministério Público, tribunais de contas, Poder Judiciário);
4) há dois tipos de legitimidade política: a legitimidade no plano da investidura (legitimidade eletiva) e legitimidade no plano do exercício, esta última a ser aferida por modo permanente;
5) permitir que empresas financiem campanha eleitoral é possibilitar a quem não possui título eleitoral eleger, de fato, os candidatos a cargo político;
6) não se pode impedir a imprensa de falar primeiro sobre as coisas nem o Poder Judiciário de falar por último;
7) os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência são deveres estatais a que correspondem direitos da população.
Encerro. Isto para dizer que o último dos citados princípios – o da eficiência – é que também por último passou a ser internalizado como direito de todos. Mas uma internalização que, por igual, não admite retrocesso. Afinal, trata-se da ideia-força de que o povo tem todo o direito a uma administração e a um governo de qualidade. De excelência até. Governo e administração tocados por agentes tecnicamente capazes. Competentes. Preparados. Vocacionados para a condução da res... pública.
Mais ainda, um tipo de preparo ou competência ou capacidade ou vocação que passa pela criatividade como ferramenta de superação de qualquer tipo de crise. Uma especial aptidão para pensar fora da caixa, então, pois “loucura é querer resultados diferentes fazendo-se sempre a mesma coisa” (Albert Einstein, outra vez). É a comentada legitimidade pelo exercício, exigente de uma ininterrupta reinvenção que tem tudo a ver com o dito popular de que “quem não for competente não se estabeleça”.
*Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal
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